quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Por que será que a inclusão gera tanta angústia?

Quando inicio uma aula ou alguma palestra sobre inclusão, sempre ouço as mesmas argumentações dos professores. O discurso é sempre igual - a escola não dá condições, eu não recebi formação, como atender um PNEE se não consigo nem dar conta dos alunos comuns-... eu entendo perfeitamente todas estas alegações e a escola pública no Brasil está um caos. Mas ao longo destes anos, com minha experiência, tenho constatado que as crianças e adolescentes que mais estressam os professores são os carentes emocionalmente. Receber um aluno cego ou PC não é difícil, tenho experiências bem sucedidas em escolas públicas. Normalmente peço aos professores que se façam o seguinte questionamento:

Qual é a nossa dificuldade em relação a dificuldade do outro?

Para olharmos o outro é necessário olharmos para dentro da gente, vencermos nossos preconceitos para aí iniciarmos o conhecimento deste outro.

A introdução do computador na educação tem provocado uma verdadeira revolução na concepção de ensino e de aprendizagem. A quantidade de programas educacionais e as diferentes modalidades de uso do computador mostram que esta tecnologia pode ser bastante útil no processo de ensino-aprendizagem, e à medida em que este uso se dissemina, passa a ser uma ferramenta de complementação, de aperfeiçoamento e de possível mudança na qualidade do ensino.

As mudanças acarretadas pela sociedade da informação foram muito rápidas, sendo que a maioria dos professores não conseguiu acompanhá-las. O uso do computador como meio educacional acontece juntamente com um questionamento da função da escola e do papel do professor. A função do aparato educacional não deve ser a de ensinar, mas a de promover o aprendizado. Isso significa que o professor deixa de ser o repassador de conhecimento para ser criador de ambientes de aprendizado e de facilitador do processo pelo qual o aluno adquire conhecimento.

Numa sociedade que busca o ensino de qualidade para todos, é fundamental que, além do uso de novas tecnologias, o professor esteja preparado para receber, em suas classes regulares, alunos portadores de necessidades educacionais especiais. Porém, atualmente, alunos com necessidades educacionais especiais estão sendo aceitos na rede regular de ensino, sem que o professor tenha alguma formação na área de dEficiência, além de não possuir a formação necessária para o uso de informática. No âmbito das tecnologias assistivas o computador pode ser um caderno eletrônico, desde que sejam utilizados hardwares e softwares adequados.

Ao estudarmos a história da educação especial no Brasil e no mundo, podemos constatar, segundo Sassazaki (1996), que esta história teve quatro principais fases.

A primeira, que corresponde ao período anterior ao século 20, pode ser chamada de fase da exclusão, na qual a maioria das pessoas com deficiência e outras condições era tida como indigna de educação escolar.

A segunda fase, chamada de segregação, já no século 20, começou com o atendimento às pessoas dEficientes dentro de grandes instituições que, entre outras coisas, propiciavam classes de alfabetização. A partir da década de 50 e mais fortemente nos anos 60, com a eclosão do movimento dos pais de crianças a quem era negado ingresso em escolas comuns, surgiram as escolas especiais e, mais tarde, as classes especiais dentro de escolas comuns. O sistema educacional ficou com dois subsistemas funcionando paralelamente e sem ligação uma com a outra: a educação comum e a educação especial.

A terceira fase, localizada na década de 70, constituiu a fase da integração, embora a bandeira da integração já tivesse sido defendida a partir do final dos anos 60. Nesta nova fase, houve uma mudança filosófica em direção à idéia de educação integrada, ou seja, escolas comuns aceitando crianças ou adolescentes dEficientes nas classes comuns ou, pelo menos, em ambientes o menos restritivo possível. Só que se consideravam integrados apenas aqueles estudantes com deficiência que conseguissem adaptar-se à classe comum como esta se apresentava, portanto sem modificações no sistema. A educação integrada ou integradora exigia a adaptação dos alunos ao sistema escolar, excluindo aqueles que não conseguiam adaptar-se ou acompanhar os demais alunos. As leis sempre tinham o cuidado de ressaltar a condição "preferencialmente na rede regular de ensino", o que deixava em aberto a possibilidade de manter crianças e adolescentes com deficiência nas escolas especiais.

Finalmente, a quarta fase, a de inclusão, surgiu na segunda metade da década de 80, incrementou-se nos anos 90 e vai adentrar o século 21. A idéia fundamental desta fase é a de adaptar o sistema escolar às necessidades dos alunos. A inclusão propõe um único sistema educacional de qualidade para todos os alunos, com ou sem deficiência e com ou sem outros tipos de condição atípica. A inclusão se baseia em princípios tais como: a aceitação das diferenças individuais como um atributo e não como um obstáculo, a valorização da diversidade humana pela sua importância para o enriquecimento de todas as pessoas, o direito de pertencer e não de ficar de fora, o igual valor das minorias em comparação com a maioria. A educação inclusiva depende não só da capacidade do sistema escolar (diretor, professores, pais e outros) em buscar soluções para o desafio da presença de tão diferentes alunos nas classes, como também do desejo de fazer de tudo para que nenhum aluno seja novamente excluído com base em alguma necessidade educacional muito especial.

O autor citado anteriormente ainda aponta alguns pressupostos básicos, que devem ser levados em consideração ao analisarmos o processo de inclusão educativa:

1. o que é melhor para pessoas dEficientes depende de inúmeros fatores (desejo dos pais; desejo das próprias pessoas dEficientes; opinião das autoridades educacionais, a realidade escolar da cidade ou região etc.);

2. escola integrada e escola integradora significam a mesma coisa, dentro da proposta surgida na fase da integração;

3. dentro da proposta de inclusão, a escola especial, a sala de recursos e os professores de educação especial terão novas e mais importantes funções, e as classes especiais não serão mais necessárias;

4. uma escola inclusiva, diferentemente de uma escola integradora, acolhe todos os alunos adaptando-se às suas diferentes necessidades;

5. uma escola comum, tal qual sempre existiu, não se torna automaticamente uma escola inclusiva só porque admitiu alguns alunos com deficiência nas classes comuns;

6. uma escola comum só se torna inclusiva depois que se reestruturou para atender à diversidade do novo alunado em termos de necessidades especiais (não só as decorrentes de deficiência física, mental, visual, auditiva ou múltipla, como também aquelas resultantes de outras condições atípicas), em termos de estilos e habilidades de aprendizagem dos alunos e em todos os outros requisitos do princípio da inclusão, conforme estabelecidos no documento "A Declaração de Salamanca e o Plano de Ação para a Educação de Necessidades Especiais".

O referido documento foi adotado por mais de 300 participantes representando 92 países e 25 organizações internacionais, presentes na Conferência Mundial sobre Educação de Necessidades Especiais: Acesso e Qualidade, realizada na cidade de Salamanca, Espanha, em junho de 1994, com o patrocínio da UNESCO e do Governo Espanhol.

Trata-se do mais completo texto sobre inclusão na educação, em cujos parágrafos fica evidenciado que a educação inclusiva não se refere apenas às pessoas com deficiência e sim a todas as pessoas, dEficientes ou não, que tenham necessidades educacionais especiais em caráter temporário, intermitente ou permanente. Isto se coaduna com a filosofia da inclusão à medida em que a inclusão não admite exceções - todas as pessoas devem ser incluídas.

SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão : Construindo uma Sociedade para Todos. Editora WVA, Rio de Janeiro, 1997.

________. As Escolas Inclusivas na Opinião Mundial. In: Sassaki, R. K. educação para o trabalho. Curitiba, 1998. workshop realizado no II Congresso Brasileiro sobre Educação Especial, 4 a 7 de abril, 1998. 2p. (mimeo).

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